terça-feira, 27 de setembro de 2011

Como melhorar o ensino

Roberto Mangabeira Unger

Educação no Brasil não presta. Nosso problema de ensino não é apenas de quantidade -- de mais vagas, escolas e professores. É de qualidade: em todos os níveis, tanto na na grande maioria das escolas particulares quanto nas escolas públicas, o ensino é pior do que medíocre; é péssimo. Sua ruindade se torna mais patente à medida que as atenções do país se voltam para a difusão do ensino médio.
Péssima sob dois aspectos. Em primeiro lugar, porque falta a grande parte do professorado o domínio das matérias que ensina. Em segundo lugar, porque o ensino, mesmo nas escolas privadas frequentadas pelas classes abastadas, continua preocupado com a trasmissão de informações. É enciclopédico em vez de ser seletivo. É factual em vez de ser analítico. É simultaneamente massificado, individualista e autoritário em vez de ser cooperativo. Sempre há o milagre dos talentos que se afirmam contra o meio. Mais importante é a tragédia das vocações, que, aos milhões, nunca se revelam, sufocadas no berço por falta de instrumentos e de inspiração.
A solução começa na convergência entre três séries de iniciativas. Todas se aplicam, com ajustes, às outras áreas da política social, inclusive a saúde e a segurança.
A primeira iniciativa é a organização de um núcleo de reformadores que dirija a reorientação do nosso ensino. E que nos dê escolas que, prefirindo o aprofundamento instigante à abrangência superficial, usem a informação para desenvolver a capacidade de análise.
A segunda iniciativa é a formação do professorado. Ganhos de salário e melhores oportunidades devem estar condicionadas a todo um itinerário de qualifacações progressivamente mais exigentes. Os Estados e os Municípios têm de participar. Só o governo federal, porém, pode bancar.
A terceira iniciativa é a associação do governo federal, dos Estados e dos Municípios em órgãos transfederais que vigiem e assegurem o preenchimento de mínimos de investimento por aluno e de desempenho por escola. É um sistema que exige para funcionar mecanismos de redistribuição de recursos dos Estados e Municípios mais ricos para os mais pobres. E que requer procedimentos para intervir, corretivamente, quando esses mínimos deixem de ser preenchidos. Ao cidadão deve caber recurso rápido ao Judiciário, à custa do Tesouro, sempre que os órgaos tansfederais malograrem em sua tarefa.
Dessas iniciativas pode resultar uma escola pública capaz de atrair a classe média. As melhores escolas devem ser as públicas, como ocorre em muitos países europeus. Beneficiária do ensino público, a classe média se tornará fiadora de sua qualidade, em proveito de toda a população.
A medida mais importante para alcançar os pobres é um programa federal maciço de bolsas de custeio que identifique em cada etapa do ensino as crianças mais dotadas ou aplicadas e que responda com ajuda pública generosa a cada demonstração de talento e de esforço. O resultado será revelar entre nossas crianças, sobretudo nas pobres e de cor, a genialidade oculta da nação.
Diz-se que reforma de educação só surte efeito a longo prazo. Não é verdade. Um programa como esse produz efeitos imediatos e dramáticos. Desperta ambições e emulações em cada família brasileira. Respeita as crianças como gente grande. Fala às cabeças. Mas levanta o país pelos corações.

Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nessa coluna. www.idj.org.br