domingo, 24 de julho de 2016

O FUTURO NO PASSADO

Poucas previsões para o futuro feitas no passado se realizaram. O mundo se mudava do campo para as cidades, e era natural que o futuro idealizado então fosse o da cidade perfeita. Mas o helicóptero não substituiu o automóvel particular e só recentemente começou-se a experimentar carros que andam sobre faixas magnéticas nas ruas, liberando seus ocupantes para a leitura, o sono ou o amor no banco de trás.
As cidades não se transformaram em laboratórios de convívio civilizado, como previam, e sim na maior prova da impossibilidade da coexistência de desiguais.
A ciência trouxe avanços espetaculares nas lides de guerra, como os bombardeios com precisão cirúrgica que não poupam civis, mas não trouxe a democratização da prosperidade antevista.
Mágicas novas como o cinema prometiam ultrapassar os limites da imaginação. Ultrapassaram, mas para o território da banalidade espetaculosa.
A TV foi prevista, e a energia nuclear intuída, mas a revolução da informática não foi nem sonhada.
As revoluções na medicina foram notáveis, certo, mas a prevenção do câncer ainda não foi descoberta. Pensando bem, nem a do resfriado.
A comida em pílulas não veio — se bem que a nouvelle cuisine chegou perto.
Até a colonização do espaço, como previam os roteiristas do “Flash Gordon”, está atrasada. Mal chegamos a Marte, só para descobrir que é um imenso terreno baldio.
E os profetas da felicidade universal não contavam com uma coisa: o lixo produzido pela sua visão. Nenhuma previsão incluía a poluição e o aquecimento global.
Mas assim como os videntes otimistas falharam, talvez o pessimismo de hoje divirta nossos bisnetos. Eles certamente falarão da Aids, por exemplo, como nós hoje falamos da gripe espanhola. A ciência e a técnica ainda nos surpreenderão. Estamos na pré-história da energia magnética e por fusão nuclear fria.
É verdade que cada salto da ciência corresponderá a um passo atrás, rumo ao irracional. Quanto mais perto a ciência chegar das últimas revelações do Universo, mais as pessoas procurarão respostas no misticismo e refúgio no tribal. E quanto mais a ciência avança por caminhos nunca antes sonhados, mais leigo fica o leigo. A volta ao irracional é a birra do leigo.


Por Luis Fernando Veríssimo

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Em nome da economia brasileira, proponho revogar a Lei Áurea

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson de Andrade, disse que o governo federal deve promover “medidas muito duras'' na Previdência Social e na legislação trabalhista para equilibrar as contas públicas. E citou como exemplo as reformas ocorridas na França, afirmando que, por lá, é permitido trabalhar até 80 horas por semana (na verdade, 60 horas). A declaração foi dada após um encontro com Michel Temer e cerca de 100 empresários do Comitê de Líderes da Mobilização Empresarial pela Inovação. Em nota, a CNI afirmou que seu presidente não defendeu o aumento da jornada. Fico pensando o que deve passar pela cabeça de uma pessoa que mora no interior do país, trabalha até não aguentar mais, recebendo um salário de fome, tendo que depender de programas de renda mínima para comprar o frango do aniversário do filho, quando vê na sua TV empresários culpando a jornada de trabalho, as leis trabalhistas e a Previdência Social pelas desgraças planetárias. E, na sequência, vê notícias de bilhões desviados em escândalos de corrupção envolvendo políticos e empresas, como nas operações Lava Jato e a Zelotes. Ou quando descobre que será ele, a xepa, que vai ter que ralar duro para tirar o Brasil da crise econômica porque os mais ricos não terão que pagar mais impostos por isso. Taxação de dividendos recebidos de empresas? Alteração decente na tabela do Imposto de Renda – criando alíquotas de 35% a 40% para cobrar mais de quem ganha muito e isentando a maior parte da classe média? Regulamentação de um imposto sobre grandes fortunas? Aumento na taxação de grandes heranças? Auditoria da dívida pública? Não, nunca! O que vocês pensam que isto aqui é? Uma democracia? A CNI pede que o presidente interino estale o chicote – mas apenas nas costas dos trabalhadores. Michel responde com uma proposta de limita de gastos com educação e saúde públicas. Mas também com o apoio a um projeto que autoriza a terceirização de todas atividades de uma empresa e a outro que afirma que o que é negociado entre patrões e trabalhadores está acima do que está previsto na legislação, mesmo em prejuízo aos trabalhadores. E, como esquecer, com propostas para aumentar a idade mínima de aposentadoria para 65 anos (para quem jea está no sistema) e 70 anos (aos que vão entrar). Vale lembrar que, no Maranhão, a expectativa de vida é de 66 anos. Nesse momento, algumas dessas pessoas sentem-se otárias, engolem o choro da raiva ou da frustração de ganharem como um passarinho, apesar de trabalharem como um camelo e torcem para a novela começar rápido e poderem, enfim, ver outra tragédia. Não porque precisam se mostrarem fortes – sabem que são. Mas porque percebem que o país não é deles mesmo. O desejo dos industriais representados pela fala de Andrade vai na direção oposta às demandas das centrais sindicais, que possuem, entre suas principais reivindicações, a redução da jornada de 44 para 40 horas semanas. A última redução ocorreu há 25 anos, na Constituição de 1988, quando caiu de 48 para 44 horas semanais. Aos catastrofistas de plantão: o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese) calculou que uma jornada de 40 horas com manutenção de salário aumentaria os custos de produção em apenas 1,99%. O aumento na qualidade de vida do trabalhador, por outro lado, seria muito maior: mais tempo com a família, mais tempo para o lazer e o descanso, mais tempo para formação pessoal. Há uma proposta de emenda constitucional que propõe essa mudança e também aumenta de 50% para 75% o valor a ser acrescido na remuneração das horas extras. Ou seja, quer o empregado trabalhando mais? Que se pague (muito) bem por isso, pois eles estarão abrindo mão de sua qualidade de vida. Outros vão dizer que boa parte das empresas já opera com o chamado oito horas por dia, cinco dias por semana. Mas não todas. Principalmente em atividades rurais. Mas se ficar decidido que o crescimento econômico é mais importante que a dignidade das pessoas, podemos – em um esforço da nação – revogar também a Lei Áurea. Olha que ideia excelente para ser abraçada pelos empresários! Convenhamos que nunca conseguimos inserir a população libertada no final do século 19 e seus descendentes continuam a ser tratados como carne de segunda, a sofrer todo o tipo de preconceitos e a receber bem menos que os brancos pela mesma função, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho. E isso iria ao encontro de um pedido de mão de obra barata e de uma das frases de caminhoneiro que nosso presidente interino mais gosta: “não fale de crise, trabalhe''. Que tal? Por Leonardo Sakamoto 08/07/2016 17:56

terça-feira, 5 de julho de 2016

Tecendo palavras, tecendo sonhos!

“Tecer” significa “entrelaçar”, “ato de produzir teia ou tecido ligando um fio a outro”. E assim eu encaro a vida, como fios entrelaçados, fios ligados, fios que podem tecer os mais belos sentimentos ou até o pior deles. Vai depender de quem os tece, vai depender de quem sonha. E será que as pessoas tecem sonhos? Ou não acreditam mais neles? Não consigo imaginar uma vida sem sonhos e sem palavras que marquem e que delineiem esses sonhos. A vida sem sonhos é como uma música sem melodia, as palavras marcam, têm sentido, mas a melodia embala, a melodia emociona, a melodia encanta. Teço palavras como quem sonha, pois cada palavra carrega o sonho, o sentimento e a crença de que sonhos podem e devem ser realizados. E se o sonho acabar? Teço outros, teço sempre. Sonho sempre. A vida nos dá esse presente todos os dias, o presente de nos reinventarmos, de refazermos nossos sonhos, de tecer outros fios, de escutar outras músicas, de viver outros amores, de ressiginificar valores, de nos transformar, de (re) viver. Teço palavras porque acredito na força que elas têm. Teço palavras porque sinto tudo o que escrevo. Teço palavras porque a vida pode ser desenhada por elas. Teço palavras porque elas reinventam. Teço palavras porque elas revelam. Teço palavras porque elas traduzem, elas marcam. Teço palavras porque escrever, também é sonhar e sonhar é viver! E um “homem sem sonhos, é um homem sem vida”. (Eça de Queiroz) Então, que teçamos e sonhemos, pois assim a vida pulsa. Assim a gente tece a vida com seus sabores e dissabores, alegrias e tristezas, saudades, inícios e fins, chegadas e partidas, começos e recomeços, fios entrelaçados e fios soltos. Assim, a gente vive, tecendo palavras, tecendo sonhos. Monique Pimentel, 14 de abril de 2013