quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Nem toda unanimidade é burra

Vamos nos brindar com um texto do Antonio Prata. Acesso restrito mas aqui compartilho por entender que todos tem o direito de ter acesso a bons textos.
Ao afirmar que "toda unanimidade é burra", Nelson Rodrigues não devia imaginar que a frase acabaria se tornando uma unanimidade —ela também, portanto, burra. Para sermos fiéis à máxima é preciso traí-la —o que não deixa de ser um paradoxo bem ​rodrigueano— e dizer que "nem toda unanimidade é burra".
Beber água faz bem. Shakespeare é genial. Todos deveríamos nos esforçar para ser pessoas melhores. Aí estão umas unanimidades nada burras. 
Soam clichê? Sim, mas na maioria das vezes usamos a linguagem para nos comunicar, não para ganhar o Nobel da literatura. Ou melhor, usávamos: em tempos de redes sociais, o conteúdo importa cada vez menos, desde que sirva pra gerar likes, causar, lacrar, enfim, nos trazer fichinhas neste gigantesco cassino online que o mundo se tornou.
Quando a informação vira commodity, passa, como todo produto, a obedecer à lei da oferta e da procura: mais rara a ideia, mais valiosa. A raridade de uma ideia, porém, pode advir não do seu brilhantismo, mas da sua cretinice. Comer um rodo, por exemplo, seria uma ideia tão estúpida quanto original. E nesta época que prefere uma estupidez inédita a uma morna sensatez, o engolidor de rodos certamente teria futuro.
Se eu lançar um livro chamado "Shakespeare, gênio da literatura", dificilmente sairei na capa dos jornais e pipocarei nos seus feeds e timelines. Mas se eu escrever "ShakesPIRO: como o imperialismo inglês e meia dúzia de afetados românticos franceses transformaram um melodrama apelativo em arte profunda", pode ter certeza de que vou fazer barulho.
Em poucos meses, provavelmente, críticos sérios lerão meu livro e provarão que eu sou uma besta quadrada e o William, não. Mas até isso acontecer, já terei escrito para cadernos culturais, debatido em feiras literárias, vou ter saído na Caras de março, fechando o verão, num camarote VIP, abraçando o Faustão.
Neste mundo de competição midiática-digital, não são poucos os que têm como ganha-pão (ou, ao menos, como ganha-like) a estratégia de afirmar que água faz mal, Shakespeare é ruim, tentar ser bom é cretino. Se o único valor é produzir ondas no lago, melhor do que jogarmos comida pros peixes é atirar urânio na água. 
"Vamos combinar que foi original, galera, ninguém antes tinha jogado material radioativo no lago!", "digam o que quiserem sobre o fulano que matou duas toneladas de peixe e contaminou um lençol freático por 20 mil anos, mas ninguém pode negar uma coisa: tá todo mundo falando dele!". 
Em busca do frisson causado pelo esdrúxulo, a mentira se traveste de originalidade, a sordidez, de ousadia. Os dentes afiados da ironia estão prontos para desacreditar qualquer mínimo consenso, afinal, "toda unanimidade é burra". Malala é uma ridícula. Raoni é ridículo. Gandhi era ridículo. Martin Luther King? Sério? Booooring!
Não estou pregando a obediência cega, o conformismo, sonhando com um mundo cor-de-rosa em que não haja discordâncias, agressividade, ruído e sujeira. Grandes artistas e pensadores usaram a marreta. De Nietzsche a Sex Pistols. Eles iam contra o status quo. Tinham coragem de nadar rio acima. É o contrário do que fazem esses Gengis Khans de Twitter, esses enfants terribles de playground, esses niilistas de salão, que fingem discordar em busca de concordância, ofendem para serem aceitos, dizem "fuck you!" e "follow me" simultaneamente. O mundo tá indo pra cucuia e a maior preocupação dessa gente é achar a sacadinha mais sacadosa pra soltar na roda.
Se as coisas continuarem neste rumo, a colisão de um novo meteoro contra o Vale do Yucatán até que parece um final feliz.
Texto de: Antonio Prata
Escritor e roteirista, autor de “Nu, de Botas”.

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Quem vigiará os professores?

Na semana passada, a ministra dos Direitos Humanos, Damaris Alves, anunciou, junto com Abraham Weintraub (Educação), os planos do governo federal de criar um canal para denunciar professores que atentassem contra “a moral, a religião e a ética da família”. Ainda não há detalhes sobre como funcionaria, mas já é possível antever sérios questionamentos a respeito da legalidade da iniciativa, visto que 99% das escolas de educação básica são administradas por municípios, Estados ou pela iniciativa privada (que, pela lei, são fiscalizadas pelas autoridades estaduais). 
Além da questão legal, cabe a pergunta de quem analisaria, de forma objetiva, o que seria um atentado contra a moral ou ética. Damaris, só para lembrar, é aquela ministra que, antes de assumir o cargo, afirmou que na Holanda especialistas “ensinam que o menino deve ser masturbado com sete meses de idade” e que “menina precisa ser manipulada desde cedo para que tenha prazer na fase adulta”. Disse também que escolas do Nordeste estavam distribuindo manuais de bruxaria para crianças de seis anos de idade, e que havia no Brasil muitos hotéis fazenda de fachada, onde “turistas iriam para transar com animais”. Se os burocratas a serem designados para analisar as denúncias contra professores forem adeptos do mesmo grau de realismo mágico da ministra, as reuniões se assemelharão mais a Tribunais da Inquisição da Idade Média do que a qualquer juízo razoável em pleno século 21.
Na mesma coletiva em que foi citado o canal, Weintraub afirmou que escolas que não promovessem um ambiente “adequado” poderiam ser punidas com menos repasses federais, e ainda que Estados e municípios têm a obrigação de “prover um ambiente construtivo para as crianças”.
Resta saber o que o ministro – que na semana passada apareceu numa entrevista acusando universidades federais de terem “plantações extensivas de maconha” e de fabricarem em seus laboratórios drogas sintéticas - define como adequado e construtivo. Imaginem se um professor, do alto de sua autoridade, respondesse a crítica de uma aluna no Twitter xingando sua mãe de “égua sarnenta e desdentada”. Ou que se referisse, em mídias sociais ou em eventos oficias da escola, a opositores políticos e chefes de estado estrangeiros como safados ou cretinos.
Descartando fatores externos à escola, uma das variáveis de maior impacto no desempenho dos alunos é o clima escolar. Ele é construído através de diálogo pautado por relações de confiança e pelo estabelecimento de laços positivos entre alunos, professores e famílias. Instaurar um canal de denúncias vindo de Brasília em nada contribui para esse objetivo. Ter um clima escolar positivo não é garantia de que não existirão conflitos ou discordâncias motivadas por visões de mundo distintas. Mas, quando eles surgem, há maior chance de superá-los de modo civilizado e respeitoso. Algo que, infelizmente, anda muito em falta em nosso ambiente político.

sábado, 2 de novembro de 2019

A desvinculação dos recursos da educação

Aprovada a reforma da Previdência, o ministro da Economia, Paulo Guedes, de novo dá indícios de que o governo apresentará uma Proposta de Emenda Constitucional ao Congresso para acabar com a vinculação orçamentária de recursos para a saúde e educação. Um dos argumentos de economistas que defendem a medida é que as regras atuais estariam engessando, de forma excessiva, o poder de gestores dos executivos federal, estaduais e municipais de redirecionarem recursos públicos para outras áreas e ajustarem contas públicas.
Hoje, a Constituição Federal obriga a União a gastar, no mínimo, 18% de da receita de impostos com educação. Para Estados e municípios, este percentual aumenta para 25%. Proteger a educação da má escolha dos governantes vinculando recursos para o setor não é uma prática nova. A Constituição de 1934 já previa percentuais mínimos para a área, e eles foram sendo ora ampliados, ora retirados, em sucessivas mudanças da Carta ao longo do século 20. Os atuais percentuais foram definidos pela Constituição de 1988, mas um dos maiores marcos dessa legislação veio cinco anos antes, com a aprovação, em 1983, da Emenda Calmon, que já estabelecia os percentuais de 25% para Estados e municípios, e estipulava 13% para a União.
E foi justamente na década de 80, após a aprovação da Emenda Calmon, que o país deu um dos maiores saltos no aumento da proporção do PIB investido em educação, de acordo com dados levantados pelo economista Paulo Maduro Júnior na tese “Taxas de Matrícula e Gastos em Educação no Brasil”. Ao refazer uma série histórica desde 1933, o trabalho mostra que foi só a partir de meados da década de 80 que o país ultrapassou e consolidou um patamar de investimento superior a 3% do PIB (o salto foi de 2,4% em 1984 para 3,8% em 1990). A Emenda Calmon não é a única explicação para isso. Cabe lembrar que este também foi o período de redemocratização, e no qual o crescimento populacional ainda ocorria em ritmo muito mais forte do que o de hoje, gerando demanda por mais vagas na escola.
Não foi em vão o esforço que o país fez para ampliar matrículas. De 1981 até hoje, a proporção da população de 4 a 17 anos fora da escola caiu de 35% para menos de 5%, ao passo que o gasto público continuou aumentando, também graças a mecanismos como o Fundef e o Fundeb. A maior escolarização pode não ter nos levado ao patamar de qualidade que desejamos, mas teve impactos significativos na redução do analfabetismo, do crescimento populacional, da mortalidade infantil, entre outras variáveis fora da escola impactadas pela educação. 
No mundo ideal, políticos brasileiros comprometidos com o interesse público não precisariam de leis os obrigando a gastar com educação. Com mais liberdade, tomariam decisões melhores, sem comprometer o atendimento numa área tão vital. Na prática, é difícil de imaginar esse cenário por aqui. Do ponto de vista das escolhas imediatas, há uma perversidade a mais no caso da educação: seus resultados são menos vistosos no curto prazo. Ruas com buracos, hospitais sem médicos, ou um dia sem coleta de lixo e transporte coletivo têm impacto imediato na popularidade de um gestor. Escolas funcionando em condições inadequadas ou com qualidade insatisfatória têm bem menos apelo. A diferença é que o custo da omissão no presente é pago por gerações.  

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Educação: a "prioridade nacional" e o discurso cínico

Diversos veículos da grande imprensa têm pecado pela fragilidade de argumentos no debate educacional brasileiro. Tirando algumas exceções, a maioria tem trazido simplificações equivocadas e discursos cínicos. O aspecto mais preocupante do fenômeno é o grave abandono do bom senso e da ulterior agenda dos direitos, como o direito a uma escola pública digna para se estudar. A opinião pública, a cada dia, vai se acostumando com uma agenda educacional medíocre, definida por termos que pouco ou nada dizem, como “expectativas de aprendizagem”, “exposição do aluno à aprendizagem” e outros disparates das mesmas e infelizes fontes terminológicas.
Com o acirramento do debate, alguns supostos “especialistas”, para encastelar sua posição e valorizá-la perante a sociedade, passam a cometer o absurdo de cindir o universo educacional entre aqueles que “defendem o professor” contra eles próprios, os autoproclamados “defensores dos alunos”. Nessa cínica e falsa divisão, que rebaixa o estudante à condição de vítima, não é preciso escola digna, bem equipada, boa merenda, professor intelectualizado, nada disso. Não é preciso respeitar os direitos de alunos e professores a espaços dignos. Com base em um grave pragmatismo ofensivo, independentemente das condições ofertadas, o objetivo é alcançar os fins, ou seja, um resultado mínimo de aprendizado em português e matemática, quando muito em ciências.
Sinceramente, não perco meu tempo me esforçando a entender essas revoltantes simplificações. Posso até ser limitado, mas tenho a humildade de saber que não há uma fórmula capaz de garantir educação de qualidade sem professor bem remunerado, com carreira atrativa, boa formação inicial e continuada. Também não consigo debater educação opondo os direitos dos educadores aos direitos dos alunos – e vice-versa. Acredito e defendo aquilo que até está sacramentado na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional; Lei nº 9.394/1996): a educação se dá em um processo contínuo de ensino-aprendizagem.
Aliás, a boa e séria bibliografia nacional e estrangeira mostra que é preciso envolver no processo educativo, além de professores e estudantes, as famílias, diretores e coordenadores pedagógicos, os demais profissionais da educação, os gestores dos sistemas públicos de ensino, a comunidade do entorno da escola, a sociedade civil, etc. Em educação, a participação dos atores altera positivamente o produto.
Diante da minha experiência de trabalho, da minha aposta na escola pública e, principalmente, do meu respeito ao bom senso, não consigo mais ler, ouvir e ler as insistentes aspas e falas de que “a educação brasileira não precisa de recursos, mas de melhor gestão”. Esse discurso é falso mesmo em sua variante politicamente correta, “não basta mais recursos, isso até é importante, mas é preciso boa gestão”. É uma espécie de falácia circular, que como toda falácia, não leva a nada.
Em primeiro lugar, eu não conheço a mágica capaz de garantir boa gestão sem profissionais bem remunerados e motivados, tanto nas escolas, como nos órgãos gestores das redes. 
De uma vez por todas, se o objetivo da nação for a consagração dos direitos sociais e a universalização de um padrão digno de qualidade de vida, não há outra saída: é preciso investir mais em educação pública. Até por que o Brasil é um dos países que mais envelhecem no mundo e, se não investirmos desde agora na atual e na próxima geração de crianças, adolescentes e jovens, não haverá gente capaz de investir no Brasil num futuro bem próximo. Nosso problema, concretamente, é muito mais profundo do que aquilo que o imediatismo ou a superfície do debate educacional e econômico nos permite observar.
Tudo isso posto, não temos mais tempo para insistir na reprodução de falácias ou na busca de soluções mágicas e falsas de gestão. Passou da hora de termos menos hipocrisia e falso bom mocismo no debate educacional. É urgente a necessidade de o Brasil pôr a educação, a ciência e tecnologia e a saúde no centro de suas prioridades. Objetivamente, pela distribuição orçamentária observada hoje, elas não são. Aliás, infelizmente, essas três áreas fundamentais estão muito distantes de alcançar algum status de prioridade no orçamento público brasileiro.

domingo, 2 de junho de 2019

LEITURA DA EDUCAÇÃO

Educar requer maturidade, buscas, pois não existe fórmula mágica. Teorias são simplesmente teorias, e muitos, principalmente coordenadores sem paixão pelo seu trabalho, tentam encaixar a escola nesse molde disforme, muitas vezes ultrapassado, impondo que professores sigam essas tendências, permitindo que o ranço continue impedindo o avanço.
Como o milagre da atuação do Conselho Escolar não acontece, a proliferação dos problemas se intensifica, fazendo com que a responsabilidade dos órgãos competentes passe longe dos corredores da sala de aula, que, com a perda de autonomia do professor e o alastramento da indisciplina, está se tornando uma atmosfera cada vez mais difícil de respirar.
O mundo evoluiu numa velocidade tão alarmante que a escola se distancia da sociedade e se perde pelos caminhos que antes acreditava serem trilhas seguras; a escola de paredes e grades está perdendo terreno para a “escola da vida”. Seus atrativos são fantásticos: portões amplos, corredores iluminados e mestres com “habilidades e competências” para transformar seus alunos em doutores na arte de ser delinquentes, pois a tradicional continua estagnada no tempo, com técnicas e princípios que não educam, e, mesmo com os avanços da ciência, que buscam caminhos alternativos para sanar problemas emergentes, estamos distantes de termos uma educação que cumpra metas para que a escola atinja as suas funções sociais.
A explicação de tantos fracassos chega a galope, pois os acontecimentos transitam por corredores, pátios, salas… e não é preciso mergulhar no tempo para entendermos: há
pouco mais de uma década, pedagogos e psicólogos eram os senhores que retinham as teorias e técnicas educativas. Atualmente, simplesmente coordenam um grupo de formadores de opinião que não assimilam a dimensão da responsabilidade diante daqueles que passam por sua regência.

No novo contexto que visa à qualidade, um dos maiores desafios é ser coordenador, pois a missão de administrar problemas e transformá-los em soluções exige mais do que idealismo. É preciso assumir a responsabilidade de direcionar trabalhos pedagógicos, motivar um corpo docente acostumado a sentar à espera das atividades prontas com ideias que abram passagem para integrar a escola à sociedade e, através desse intercâmbio, fazer com que a unidade de ensino atinja as metas sociais, políticas e econômicas da Educação. 
Na fase de estruturação, alunos, professores, governo e pais não falam a mesma língua. E cada um tem um pretexto convincente para explicar o não cumprimento dos seus deveres. O mercado de trabalho está recebendo profissionais despreparados e terá que capacitá-los para garantir a qualidade de seus serviços e produtos para não ser esmagado pela concorrência.
Ante o desequilíbrio, a escola se depara com dificuldades para cumprir o seu papel na aplicação dos valores humanos, pois, mesmo inserida nesse contexto, lança barreiras que a impedem de atingir seus objetivos. 

Mas conduzir a escola por um caminho que atenda às necessidades, em meio a um furacão de instabilidade, é realmente um sonho que se torna cada vez mais distante de se realizar, pois educar uma sociedade deficiente de valores exige uma escola que descarte teorias frívolas, conteúdos evasivos e métodos ultrapassados através de reformas condizentes às necessidades da clientela.
Enquanto a escola permitir ser administrada sob interesse político-partidário e a Educação continuar com professores desmotivados e descompromissados com o ofício de ensinar, a escola dos meus sonhos continuará a ser apenas um sonho.

domingo, 5 de maio de 2019

Loucos por gente

Nós, professores, temos um grande vício: somos apaixonados. E todo apaixonado é meio insano, faz alguma coisa que nem sempre deveria, se dedica mais do que pode, às vezes se esquece de si mesmo. Ou então não se lembra de que nós exercemos uma profissão, que precisamos receber nosso salário de forma adequada, que temos de lutar na estrutura sindical e organizar nossas reinvindicações no público e no privado. Às vezes, até disso nós nos esquecemos. Não deveríamos, mas esquecemos, porque somos apaixonados.
Todo professor íntegro leciona por paixão. Paixão pelo quê? Por ganhar pouco, correr o dia inteiro, ficar para lá e para cá? Não, claro que não. Temos paixão por aquela ideia de que gente foi feita para ser feliz. Como diria Shakespeare, “Vida é uma coisa cheia de som e fúria”. Nós somos furiosos, brigamos muito.
Imagine uma reunião de professores no final do ano. Um colega quase pula no pescoço do outro por causa de um aluno. Nós fazemos barulho e somos tão ruidosos porque somos apaixonados. Aliás, professor adora se encontrar, adora reunião — se for paga, então, gosta mais ainda. Reunião de professor dura, mais ou menos, uma hora e meia, sempre dividida da seguinte maneira: na primeira meia hora, ficamos às vezes falando mal de quem não veio, dizendo “Nós estamos aqui, é um absurdo”; na segunda meia hora, ficamos falando bem de quem veio, “Mas nós viemos, nós vamos levar isso à luta porque isso é importante”; e, na terceira meia hora, buscamos horário para marcar outra reunião. E acontece tudo de novo…
Professor adora o período de férias, quando os alunos desaparecem da escola. Ele aguenta um dia, dois, de repente começa a sentir falta. A escola fica triste e em silêncio, não tem aquele barulho. Tem professor que fica louco para as aulas começarem, e, quando elas começam, depois de uma semana, ele não aguenta mais, quer que tudo pare. É mais ou menos como a mãe que diz para os filhos: “Eu não aguento vocês; eu vou me matar; um dia, eu vou sumir, e vocês vão ver”. Nós também falamos demais.
Mas temos uma coisa inacreditável, que é uma amorosidade muito grande. Só isso explica por que uma pessoa dá aula por 20, 30 anos, se aposenta e depois volta a lecionar. Por que tem professor que não aguenta ficar fora de uma sala de aula? Ora, não tem gente que é louca por pizza? Então, também existe quem seja louco por gente. Que, em vez de cuidar só da própria vida, resolve ajudar outras vidas também.
Essa característica não é exclusiva dos professores, claro. Isso tem a ver com a amorosidade, que, por sua vez, tem a ver com amor, que é uma palavra que anda meio ausente na Educação e não deveria. Quem ama não desiste. Quando começamos a desistir um pouco da nossa atividade, dos nossos alunos, começamos a perder um pouco o gosto. Se você está deixando de amar, aí é melhor deixar, porque Educação pressupõe uma capacidade amorosa imensa, não é inesgotável, porque nada o é, mas ela deve ser imensa. E, por ser amorosa, essa atividade precisa de condições de trabalho, de estrutura salarial, de organização pedagógica, de jornadas adequadas… senão não dá para exercer essa amorosidade de forma concreta.
Lembrar sempre: insistir, repartir e não desistir.

CORTELLA, Mario Sergio. Nós e a Escola: Agonias e Alegrias, p. 20-22, Petrópolis: Vozes, 2018.

domingo, 7 de abril de 2019

Um bom começo, por uma primeira infância saudável para todos

Há hoje um certo consenso, entre especialistas em educação e saúde, de que a primeira infância é o momento mais importante para se criar as condições para um desenvolvimento integral e saudável da criança. 
É nessa fase que se ensaiam elementos de compreensão de mundo, de comunicação com os outros, de conhecimento do próprio corpo e o manejo das emoções. 
A formação de sinapses permitirá que sensações sejam processadas e que aprendizados se acumulem, em um processo orientado pela riqueza das experiências vividas pela criança e pelo afeto de que se vê cercada. 
O grande inimigo dessa fase é o chamado estresse tóxico ou traumático, em que a violência ou a negligência extrema podem trazer danos fortes, alguns irreversíveis, ao desenvolvimento infantil.
Pela complexidade e relevância dessa fase, há igualmente um consenso de que se trata de um período em que diferentes políticas públicas devem atuar para assegurar o pleno desenvolvimento da criança e a garantia de seus direitos. 
Para a educação, o que se busca é assegurar que as crianças cujos pais assim o desejarem tenham acesso a creches de qualidade, com prioridade para as famílias em situação de pobreza extrema, e garantir a todas elas boas pré-escolas. 
Mas não é suficiente —e, em alguns casos, nem desejável, institucionalizar crianças pequenas. A formação de vínculos fortes com pais e outros membros da família é tão ou mais importante quanto os cuidados e a educação de uma creche. 
(...)
Ainda há muito o que fazer para promover igualdade de oportunidades em nosso país, mas, se todas as crianças em situação de vulnerabilidade se beneficiarem de atenção, educação e cuidados necessários, será um bom começo.

Claudia Costin
Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

O que verdadeiramente somos? Ego ou Alma ?

O que nós verdadeiramente somos? Somos Seres Espirituais que habitam um corpo físico. Não somos nosso corpo, isso é matéria, é orgânico. O corpo é protegido pelo nosso ego. Somos seres sensitivos que pensam. Somos emocionalmente racionais.
Um dia, todos nós iremos morrer e ele vai acabar. O nosso verdadeiro Ser, aquilo que realmente somos é nossa Alma, que é infinita, e é isso que nunca morre. A alma necessita do corpo físico e do nosso ego para transcender em nossa existência neste plano terrestre.
A palavra Alma vem do latim animus, que anima. Ela é nossa parte imortal, é nossa vida, essência fundamental, é o Sopro de Vida. Ela é um movimento que é maior que o corpo, maior que a matéria. A Alma “vive dentro do corpo, por isso precisa dele, porém ela também é separada dele, pois não acaba quando ele morre, ela é eterna e não se dissipa.
É claro que manter nosso corpo físico saudável é essencial, essa é a função maior do nosso ego, afinal a manutenção de nossa Alma neste plano depende da manutenção da matéria. Mas não devemos esquecer que os desígnios espirituais são muito mais importantes que os materiais.
É comum não pararmos para refletir sobre o que é mais essencial em nossas vidas, assim focamos em acumular bens materiais que, na verdade, não tem valor. O ego tem necessidade da riqueza material, de relacionamentos e também de conhecer a bondade e compaixão. Afinal quando morremos, não levamos nenhum dinheiro, casa, e nem o prestígio ou poder que essas riquezas proporcionam no plano terrestre.
Temos que ter atenção para não nos perdermos na correria dos afazeres e dificuldades do cotidiano que nos distraem de ver o todo, apreciar os pequenos momentos de felicidade que estão em todo o lugar e finalmente nos desviam de encontrar nossa missão, realizar nosso propósito e deixar um legado terreno. Quando não focamos em nossos objetivos maiores as distrações nos aprisionam. Você já parou para refletir sobre aquilo que está aprisionando seu Ser, sua Alma, que não a deixa ser livre?
Podemos viver em dois estados internos, o Estado de Graça, beleza interior, paz, não comparação, não julgamento, que é a Consciência da Unidade“ ou o Estado de Sofrimento, de dor, de comparação, julgamento, um estado destrutivo, que é a “Consciência do Ego.
Temos o poder de escolher de qual Estado interno e de qual consciência partimos, de qual Estado interno realizamos nossas tarefas, tratamos as pessoas, buscamos atingir nossas metas, conviver com o outro e convivemos com nós mesmos.
Convido você a refletir também: de qual Estado você quer criar Riqueza, Abundância e Prosperidade? Você vive em um Estado de Paz ou Guerra Interna? E o que isso gera para você e para as pessoas dos seus sistemas?
Se você vive em um Estado de Sofrimento seu Ego está dominando você. O Ego é parte de nós, mas não é nossa Alma, o Ego é criado pela Alma  e tem como propósito protegê-la. Protegendo o corpo físico a Alma é protegida.
Quando somos dominados pelo Ego não vivemos no tempo presente, ficamos presos ao passado e julgamento ou ao futuro. Neste estado somos mais egoístas e vivemos na realidade material, diferentemente da Alma que vive na realidade energética.
O Ego tem necessidades. A experiência maior do Ego é o Medo. Medo da morte, da limitação do corpo e de não conseguir satisfazer suas necessidades. Quando vivemos pela experiência do Ego ficamos como medo da falta de dinheiro, de não termos conforto, de não sermos estimados, de não sermos lembrados, amados, de não termos poder. A alma não tem medo, tem desejos.
Porém quando vivemos em um Estado de Graça, vivemos pelo Propósito da Alma, vivemos em paz, estamos presentes, experienciando o AGORA, e consequentemente alcançamos uma riqueza energética, estamos mais próximos do divino, da Iluminação, pensamos no coletivo, na Unidade, e geramos uma Abundância e Prosperidade duradouras que se propagam a todos aqueles ao nosso redor e não somente nós mesmos.
Quando vivemos pelos desígnios da Alma buscamos a evolução e a conexão. Nossos dons e talentos únicos são usados para atingir nosso propósito maior de servir com amor toda a Humanidade, realizamos os desejos mais verdadeiros e profundos do nosso Ser.
Como podemos nos livrar da dor, dos sentimentos negativos e viver pela experiência da Alma? Como podemos verdadeiramente libertar nossa Alma? O primeiro passo é buscar o Autoconhecimento Intenso e daquilo que te trava, que te impede de seguir em frente, visando e alcançando seus objetivos com mais facilidade.
Tenha em mente que a solução das suas dificuldades não está no mundo exterior. As perturbações são criadas e vivem dentro de nós, assim procurar as respostas a questões tão essências no externo nunca trará resultados completamente satisfatórios. Você não se sentirá absolutamente livre visando o que está fora de você, pois sempre surgirão novos questionamentos.
A solução definitiva é conhecer-se e não se perder dentro de suas dificuldades. E assim, pelo Autoconhecimento, você toma as rédeas de sua vida para realizar seu propósito com mais clareza, de maneira mais leve e em paz, desse modo se alcança a verdadeira Liberdade Interna.
Te convido a refletir mais uma vez: quais são as suas sombras? A partir de qual Estado da Consciência (Ego ou Unidade) e de qual Estado Interno (Sofrimento ou Graça) você vive? Há alguém que você tenha que perdoar? Você já perdoou a si mesmo pelos erros e insucessos do passado? O que te faz perder a paciência? Você já descobriu seu propósito maior? Esse e tantos outros questionamentos são essências para descobrir o que te aprisiona e como você pode libertar a sua Alma.
Só você tem as respostas para as perguntas que farão a diferença em sua vida. Lembre-se sempre de se lembrar de nunca mais esquecer: na Caverna mais profunda está o Tesouro mais Precioso e no Veneno sempre estará o Antídoto.
Assim você encontrará as respostas para as questões mais difíceis da sua vida em si mesmo, libertando-se do passado, ressignificando suas dores, enxergando a realidade através da perspectiva positiva, perdoando quem lhe causou mal e perdoando a si mesmo.
Somente aí você será “VERDADEIRAMENTE LIVRE  e poderá cumprir seu verdadeiro propósito, o Propósito da Alma de SER FELIZ !

O TEXTO NÃO É MEU, MAS VALE A PENA A LEITURA. MPS

sábado, 12 de janeiro de 2019

Escola sem Partido

Não sou simpático à lei da Escola sem Partido. Sou professor há 22 anos. Ela pode virar um belo sistema randômico de censura. Pais de alunos são imprevisíveis. 
Um dia posso estar falando de darwinismo e um pai evangélico considerar que estou pregando ateísmo. Um dia posso estar dizendo que a espécie humana reproduziu e sobreviveu porque a maioria dela é heterossexual e algum aluno filho de um casal gay pode me acusar de homofobia. 
Você duvida? Se sim é porque anda alienado da realidade ridícula que o mundo está vivendo. As mídias sociais tornaram o ressentimento uma categoria política de ação. Os ressentidos perderam a vergonha na cara.
Ilustração da coluna do Pondé do dia 26.nov.2018
Ricardo Cammarota/Folhapress
Não gosto de leis, não confio em juízes, promotores ou procuradores. 
O Ministério Público com frequência nos considera cidadãos hipossuficientes e decide processar você por descrever a relação entre peso e massa na lei da gravidade numa aula —e essa lei não respeitaria as sensibilidades de pessoas vulneráveis psicologicamente devido ao maior peso delas.
Minha oposição à lei da Escola sem Partido não é porque eu não saiba que grande parte dos professores prega marxismo e similares em sala de aula. Prega sim. E a universidade não é um espaço de debate livre de ideias. Isso é um fetiche, para não dizer diretamente que é uma mentira deslavada. 
A universidade é um espaço de truculência na gestão, na sala de aula, nos colegiados, no movimento estudantil. 
Lobbies ideológicos ou não dilaceram as universidades quase as levando à inércia produtiva —principalmente nas “humanas”. 
Quem discordar da cartilha de esquerda é “fascista”. Minha oposição à Escola sem Partido é porque ela é uma lei.
Sei. Ficou confuso? Vou repetir: minha oposição à Escola sem Partido é porque ela é uma lei. Com ela, aumentaríamos o mercado para advogados e a justificativa pra mais gasto com o Poder Judiciário. 
Quem a defende parece não entender que lei em matéria de costumes é como um elefante em loja de cristais. Outra área em que lei é como um elefante em loja de cristais é no 
campo dos afetos.
Meu argumento, ao contrário do que podem pensar inteligentinhos de direita e de esquerda, é profundamente conservador, no sentido que o conceito tem na filosofia britânica a partir do século 19 
—o conceito sem a palavra surge no final do 18 com Edmund Burke (1729-1797), a palavra surge na França nos primeiros anos do século 19, segundo o historiador das ideias Russel Kirk (1918-1994).
No sentido filosófico, e não no debate empobrecidos das militâncias, ser conservador é ser cético em matéria de invenções políticas, econômicas, sociais ou jurídicas. 
Um temperamento conservador, como diria Michael Oakeshott (1901-1990), filósofo conservador britânico fundamental para o assunto, desconfia da fúria “racionalista” de se inventar, por exemplo, leis que interfiram sobre hábitos e costumes (estes, sim, pérolas para um cético em política).
Aliás, pouco se sabe entre nós sobre o que é, no sentido erudito e conceitual, ser conservador. Qual a razão de não sabermos? Pergunte aos professores e coordenadores de escolas e universidades. A bibliografia escolhida por eles é, na imensa maioria das vezes, uma pregação em si. 
Alunos de escola, de graduação e pós-graduação, constantemente, são boicotados em sua intenção de conhecer outros títulos que não seja a cartilha com Marx e seus avatares.
A lei da Escola sem Partido é uma solução ruim para um problema real. A crítica a ela, sem reconhecer que sua motivação é justificada, presta um enorme desserviço ao debate. 
Com isso não quero dizer que professores marxistas de história mentindo pura e simplesmente ou restringindo o acesso a múltiplas “narrativas” (como é chique falar agora) sejam a principal questão no 
Brasil de hoje em dia. 
Existem muitas outras, como economia, corrupção, violência urbana, e outras mais. Mas, a formação educacional ideologicamente enviesada, por exemplo, faz muita gente “educada” abraçar movimentos como o Lula Livre, achando lindo.
A educação piorou muito depois que os professores resolveram pregar em sala de aula em vez de ensinar rios e capitais dos estados e países. Simples assim. Mas aumentar o mercado jurídico no país é um engano grave. Já somos presas demais do crescente lobby jurídico para não ver isso.
Luiz Felipe Pondé
Escritor e ensaísta, autor de “Dez Mandamentos” e “Marketing Existencial”. É doutor em filosofia pela USP.