segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Quem vigiará os professores?

Na semana passada, a ministra dos Direitos Humanos, Damaris Alves, anunciou, junto com Abraham Weintraub (Educação), os planos do governo federal de criar um canal para denunciar professores que atentassem contra “a moral, a religião e a ética da família”. Ainda não há detalhes sobre como funcionaria, mas já é possível antever sérios questionamentos a respeito da legalidade da iniciativa, visto que 99% das escolas de educação básica são administradas por municípios, Estados ou pela iniciativa privada (que, pela lei, são fiscalizadas pelas autoridades estaduais). 
Além da questão legal, cabe a pergunta de quem analisaria, de forma objetiva, o que seria um atentado contra a moral ou ética. Damaris, só para lembrar, é aquela ministra que, antes de assumir o cargo, afirmou que na Holanda especialistas “ensinam que o menino deve ser masturbado com sete meses de idade” e que “menina precisa ser manipulada desde cedo para que tenha prazer na fase adulta”. Disse também que escolas do Nordeste estavam distribuindo manuais de bruxaria para crianças de seis anos de idade, e que havia no Brasil muitos hotéis fazenda de fachada, onde “turistas iriam para transar com animais”. Se os burocratas a serem designados para analisar as denúncias contra professores forem adeptos do mesmo grau de realismo mágico da ministra, as reuniões se assemelharão mais a Tribunais da Inquisição da Idade Média do que a qualquer juízo razoável em pleno século 21.
Na mesma coletiva em que foi citado o canal, Weintraub afirmou que escolas que não promovessem um ambiente “adequado” poderiam ser punidas com menos repasses federais, e ainda que Estados e municípios têm a obrigação de “prover um ambiente construtivo para as crianças”.
Resta saber o que o ministro – que na semana passada apareceu numa entrevista acusando universidades federais de terem “plantações extensivas de maconha” e de fabricarem em seus laboratórios drogas sintéticas - define como adequado e construtivo. Imaginem se um professor, do alto de sua autoridade, respondesse a crítica de uma aluna no Twitter xingando sua mãe de “égua sarnenta e desdentada”. Ou que se referisse, em mídias sociais ou em eventos oficias da escola, a opositores políticos e chefes de estado estrangeiros como safados ou cretinos.
Descartando fatores externos à escola, uma das variáveis de maior impacto no desempenho dos alunos é o clima escolar. Ele é construído através de diálogo pautado por relações de confiança e pelo estabelecimento de laços positivos entre alunos, professores e famílias. Instaurar um canal de denúncias vindo de Brasília em nada contribui para esse objetivo. Ter um clima escolar positivo não é garantia de que não existirão conflitos ou discordâncias motivadas por visões de mundo distintas. Mas, quando eles surgem, há maior chance de superá-los de modo civilizado e respeitoso. Algo que, infelizmente, anda muito em falta em nosso ambiente político.

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