domingo, 31 de outubro de 2010

Ver, aprender e criar

Escola a serviço da comunidade: em Roraima, projeto combate desidratação em escola indígena

Vem do extremo norte do País um eficiente exemplo de parceria entre comunidade e escola. A 40 quilômetros de Amajari, em Roraima, a Escola Estadual Indígena Tobias Barreto é, ao mesmo tempo, instituição de ensino e fonte de melhora em qualidade de vida para os cerca de 150 habitantes da aldeia indígena de Mangueira. “A comunidade e a escola, em muitos momentos, se misturam”, conta o professor Paulo Roberto Temóteo, que apresentou o que ocorre na região durante a cerimônia de premiação da 2ª edição do Prêmio Minha Comunidade Sustentável – a Tobias Barreto foi agraciada no evento.

Cerca de 150 pessoas vivem nessa aldeia de Mangueira. São indígenas pertencentes a duas etnias: os wapixana, que correspondem a 90% da população, e os macuxi. Ao longo de 2010, alunos e docentes exemplificarão o papel de referência da Escola Tobias Barreto para os moradores locais. Por meio de um projeto chamado Aruray, que tem o professor Temóteo no comando, a comunidade deve ganhar uma horta interligada a um pomar na escola para enriquecer a merenda escolar e combater os frequentes casos de desnutrição e desidratação, que chegam a 80% dos habitantes. A alimentação dessas pessoas é composta basicamente de farinha, arroz e jabá (charque), com “praticamente zero de frutas e legumes”, explica o professor. Depois da criação de horta e pomar, serão incorporados à dieta jerimum (abóbora), beterraba, tomate, aipim (mandioca), além de frutas como mamão e goiaba.

O Projeto Aruray, que é possível graças à premiação de 6,7 mil reais do Minha Comunidade Sustentável, vai além da diversificação dos alimentos. Os alunos do Ensino Fundamental participarão de encontros para conscientizar a comunidade sobre ocupação do solo e a importância de consumir produtos orgânicos. “Algumas famílias criam hortas dentro da mata e, para isso, fazem queimadas”, afirma Temóteo. O objetivo do professor é mostrar que é possível construir hortas e pomares na vegetação de lavrado, promovendo o mínimo de desmatamento possível. “O ideal seria que, para cada árvore ceifada, se plantasse outra. Isso será feito nos arredores da horta, com o plantio de árvores frutíferas que fornecem alimentos e sombra, pois a escola está localizada em uma região que faz muito calor”, relata.

Os docentes da escola já passaram por um treinamento que vai prepará-los tanto para a implementação prática do projeto quanto para as aulas teóricas ministradas aos estudantes. Na medida em que as etapas forem concluídas, haverá um trabalho multidisciplinar abarcando Matemática, Português, Geografia, História, Ciências e Língua Materna Indígena. “Em Ciências, por exemplo, trataremos de temas como alimentos orgânicos e seus benefícios em relação a produtos industrializados”, conclui Temóteo.

O nome do projeto foi escolhido com o objetivo de valorizar a cultura indígena local. O professor pretende estimular o máximo possível a língua materna dessa população, visto que, assim como outros costumes, ela vem sofrendo com o processo de aculturação. De 150 habitantes, por exemplo, menos de dez dominam a língua wapixana.

Merenda agroecológica: escola cearense cria horta e viveiro para melhorar alimentação e complementar a renda da sua comunidade

A cidade cearense de Jaguaruana localiza-se a cerca de 150 quilômetros da capital, Fortaleza. O município é responsável pela merenda enviada à Escola de Educação Fundamental Nossa Senhora do Livramento, situada no Assentamento Bela Vista. Segundo a professora Maria Elisabete da Silva, a alimentação dos alunos é composta de suco com bolacha, cuscuz com rapadura, sopas e mingaus, sem frutas e verduras. Além do mais, todo os complementos são adquiridos fora do assentamento – que fica a 18 quilômetros da cidade – e os moradores não têm informações de controle de qualidade. Agora, com 6,2 mil reais recebidos pelo 2º Prêmio Minha Comunidade Sustentável, a professora Maria Elisabete espera reverter a situação.

Para tanto, o Projeto Horta e Viveiro Agroflorestal Comunitários visa utilizar uma área de 1 hectare para ser usada em plantio. Nessa área serão utilizados princípios da agroecologia como compostagem, adubo orgânico e controle de pragas e doenças. Com isso, além de capacitar os alunos e possibilitar experiências pioneiras na área de agroecologia, serão adicionadas à merenda escolar frutas e verduras. A escola também já recebeu o apoio da prefeitura para fazer respeitar a Lei Federal 11.947, de junho de 2009, que obriga a merenda escolar a conter ao menos 30% de alimentos comprados de agricultores familiares – no caso do assentamento. “Isso traz uma renda complementar à comunidade”, explica Maria Elisabete, que também é gestora do Horta e Viveiro Agroflorestal. O objetivo da professora é que todas as frutas e verduras passem a ser produzidas dentro do assentamento Bela Vista, deixando para a prefeitura apenas produtos não cultivados pelas famílias, como arroz e macarrão.

Desde o início do ano, os 404 alunos de Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA) da instituição participam de atividades de conscientização sobre agroecologia. Agrônomos do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural já realizaram dois cursos – sobre olericultura e viverística – com os estudantes. As técnicas de cultivo aprendidas nessas aulas são repassadas aos moradores do assentamento, para que eles possam reproduzi-las em suas terras. Em troca, parte da madeira necessária para a construção do viveiro e da horta foi doada pela comunidade.

Reflorestamento
A recuperação de áreas desmatadas é uma das prioridades do projeto. Segundo Maria Elisabete, antes da criação do assentamento, há 14 anos, a região era utilizada por empresas para o cultivo de melão, uva e legumes. Mesmo com o fim dessa atividade, a perda de mata nativa não foi interrompida, uma vez que as famílias de assentados tinham na mata um meio de subsistência, com a extração de madeira para lenha. Além de trabalhar com os alunos a sensibilização dessa população para a preservação da vegetação, a escola armazenará no viveiro mudas de angico, sabiá, aroeira, imburana, cumaru, juazeiro, jucá e tamarindo, para serem plantadas posteriormente nas regiões descobertas.

Pela preservação do Cerrado: graças às queimadas, povoado no Tocantins sofre com a perda da biodiversidade. Ação de escola visa reverter o quadro por meio da conscientização e do replantio de mudas

No povoado de Centro dos Borges, distante 18 quilômetros do município de Riachinho, em Tocantins, habitam cerca de 2 mil pessoas. Parte dessa população se divide entre três assentamentos, criados há mais de 20 anos após um loteamento de terras promovido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra. A coleta de lixo de Riachinho passa por Centro dos Borges apenas uma vez ao mês, frequência insuficiente para atender à demanda. Por isso, a maioria dos moradores queima resíduos domésticos nos quintais de suas casas. “A fumaça chega a prejudicar o andamento das aulas”, diz a professora da Escola Municipal Tancredo Neves, Vilma Francisca de Sousa Pereira, que também é gestora do projeto Controle e Uso Racional do Fogo no povoado de Centro dos Borges, um dos vencedores do 2º Prêmio Minha Comunidade Sustentável.

As ações da iniciativa visam atingir dois objetivos principais: conscientizar a comunidade a substituir a queima de entulhos por aterros e coleta seletiva, além de promover o reflorestamento das áreas de cerrado desmatadas para ajudar no sequestro de carbono. A primeira meta já está em execução. O problema foi apresentado aos alunos e a escola estabeleceu parcerias com a Secretaria de Meio Ambiente e Ecoturismo de Riachinho e o Naturantins (Instituto Natureza do Tocantins). Este envia profissionais para ministrar palestras de conscientização ambiental aos discentes. Com parte dos 13 mil reais recebidos pelo Minha Comunidade Sustentável, os estudantes confeccionarão cartazes, faixas e banners para participar de caminhadas educativas e mutirões de limpeza. Para complementar, a escola adquiriu recipientes instalados no povoado para que a seleção de resíduos se torne permanente. “Queremos que o recolhimento do lixo pela prefeitura passe a ser semanal”, conclui Vilma.

Os cerca de 400 alunos da Tancredo Neves também serão ativos no segundo objetivo do projeto, uma vez que estão a cargo do plantio de mudas nativas nas regiões sem vegetação. A professora Vilma conta que as famílias no povoado fazem as queimadas para propiciar o plantio de arroz, feijão, milho e fava, além de frutas, como banana e melancia. O projeto não visa interromper totalmente as queimadas, uma vez que essas lavouras são fontes de sustento aos assentados, mas amenizá-las o máximo possível. “Estamos trabalhando para que o município empreste tratores aos agricultores, para que a terra possa ser arada e não seja preciso atear fogo na mata todos os anos”, explica Vilma.

Com os recursos, a escola comprará materiais para a construção de uma estufa, onde as mudas serão cultivadas e armazenadas. Especialistas do Naturantins auxiliarão na montagem do viveiro, que cultivará ipês, pés de jambo, murici, caju e manga, árvores e frutas que em pouco tempo serão muito mais presentes na paisagem de Centro dos Borges.

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