Fala-se menos do que se deveria na pedagogia do amor e o
pouco que se fala é, muitas vezes, vago. O tema, então, se perde pela
sua abstração e incompreensão das pessoas, o que ocasiona desconfiança e
desinteresse; todavia, tanto como parte do método pedagógico quanto
como um dos objetos de estudo, o amor é aquilo que pode mudar
completamente o mundo para melhor desde que seja bem entendido.
A noção predominante de amor é a romântica, que o entende
como um sentimento afetivo entre dois seres, normalmente um homem e uma
mulher, e daí surge, inclusive, o preconceito lastimável contra aqueles
que procuram relacionamentos homossexuais. Esses dois seres buscam uma
união quase sempre calcada na atração física e/ou sexual, quando a
motivação não é ainda mais superficial, como financeira ou outra
similar.
Para além dessa ótica predominante, há uma segunda, muito
parecida, que estende o amor a um sentimento afetivo entre dois seres
por laços familiares ou por simpatia. Esta é uma sintonia gerada por
interesses ou outros elementos em comum, que podem ser positivos ou
negativos.
Não existe amor ou desamor à primeira vista, mas apenas
simpatia ou antipatia à primeira vista. Simpatia é sentimento
direcionado a uma pessoa. Amor é um sentimento sem direção, que
ultrapassa o ser humano, estendendo-se aos animais, ao elementos
naturais (fogo, água, terra, vento), ao planeta, ao cosmo.
O amor amplamente prevalecente, almejado e praticado na
humanidade não é aquele em sua profundidade e amplitude. É um amor
romantizado, vendido em filmes, novelas e propagandas, muito mais ligado
a paixões e interesses menores do que a sentimentos edificantes e
libertadores.
Por tal razão, ele degenera facilmente em apego, cobrança,
manipulação, quando não se transforma em ódio por conta da frustração
das paixões e interesses mencionados. Quase sempre, o amor é praticado
com egoísmo, muito mais em busca de algo em troca do que de apenas se
doar ao outro e de fazê-lo um ser melhor.
O amor, como deve ser compreendido em uma comunidade mais
desenvolvida, é um sentimento muito mais próximo da fraternidade em um
nível ótimo, um “‘estado afetivo de plenitude’, incondicional, imparcial
e crescente”, como diria Ermance Dufaux.
O verdadeiro amor preenche, eleva o ser a um estado de
felicidade incomparável, inabalável pelos arrastamentos menores das
paixões humanas. Ele não é condicionado a retorno; não é diferente de
acordo com o ser ou com qualquer outro critério; e só vai crescendo na
medida em que a pessoa se desenvolve.
O verdadeiro amor é profundo, pois submete as paixões e
interesses individuais em prol de uma ligação com tudo e todos, gerando
respeito, paciência, indulgência, tolerância, unicidade com a natureza;
sentimentos muito mais edificantes do que aqueles gerados, em regra,
pela ótica de amor hoje predominante.
O verdadeiro amor não diferencia o sentimento que se tem do
filho e do vizinho que causa incômodo, por mais utópico que isso possa
parecer. O amor dos pais para com os filhos é talvez o mais puro que
existe hoje. É, em diversos casos, um amor incondicional, que tira o
fôlego e que perdura, não importa o que aconteça. No entanto, as pessoas
não são ensinadas a amar os demais. “Os outros são os outros”. “A
família antes de tudo”. Quantos chavões não existem hoje para expressar
que só devemos nos preocupar com “os nossos” e os outros que se danem?
Devido à falta de amor da humanidade, se não houvesse a
família, dentro da qual se estimula o amor pelos laços de sangue e pela
convivência muitas vezes forçada, o planeta provavelmente já teria sido
destruído, e observem que, mesmo assim, não falta muito para isso.
O problema é que as relações familiares se tornaram as
únicas importantes para muitos, até porque da felicidade do cônjuge e
dos filhos muitas vezes depende a felicidade do próprio indivíduo.
Então, há frequentemente mais egoísmo do que amor por trás de certas
atitudes protetivas da família.
Com verdadeiro amor, não haverá escolhas em torno de quem
deve ser protegido e quem deve ser prejudicado, a não ser sob critérios
de justiça; não haverá injustiças aos outros em prol da família ou de si
mesmo; não haverá nacionalismos que prejudicam outros países sem
remorso; etc. O amor une a todos, torna a sociedade uma única família.
É esse sentimento que deve ser utilizado para ensinar nos
lares e nas escolas por meio, sobretudo, de atividades práticas e do
exemplo. Na medida em que se ensina pela pedagogia do amor, já se ensina
o amor pelo exemplo, a melhor forma de ensino, por ser sentida e,
principalmente, vivida, e não apenas racionalizada. Quando o outro
compreende o verdadeiro amor em alguém, é difícil que não queria
praticá-lo, pois nota como quem ama verdadeiramente emana positividade, é
pleno e feliz.
Diversos estudos comprovam que países mais desenvolvidos em
termos de qualidade de vida e desenvolvimento em sentido amplo revelam
altos graus de fraternidade. Sociedades com mais qualidade de vida são
as que desenvolveram melhor o sentimento de verdadeiro amor, criando,
por consequência, instituições mais inclusivas, fraternas.
Pestalozzi dizia que o mérito da
sua experiência na cidade de Stans foi transformar cerca de 70 crianças órfãs, embrutecidas pela vida, em irmãos, em indivíduos generosos, justos e morais.
O seu método era, primeiro, satisfazer as necessidades
mínimas das crianças, garantindo-lhes condições básicas para a
aprendizagem e para o desenvolvimento de sentimentos positivos. Deste
modo, sem políticas sociais que garantam o mínimo de alimentação, saúde,
lazer etc., é difícil que a criança tenha um desenvolvimento adequado e
que cresça amorosa, pois o embrutecimento tende a gerar negatividade.
Uma das principais tarefas da educação é estimular a sensibilidade
natural, a conectividade e a fraternidade com as quais todos nascem.
Não se entenda a pedagogia do amor como mimos e tratamento
infantil. Ao contrário, é dar o respeito necessário a cada indivíduo
independentemente da sua idade; é corrigir comportamentos os mais
negativos com instrução sábia e até mesmo rígida, porém com o máximo de
paciência, tolerância e indulgência, entendendo profundamente a
individualidade de cada um.
A pedagogia do amor não quer modificar a essência natural do
ser, mas dar as condições para que suas habilidades sejam maximizadas.
Ao contrário da educação atual, que tem a presunção de saber aquilo o
que os indivíduos precisam aprender, a pedagogia do amor lhes dá certa
liberdade para escolher o que preferem aprender e percebe os talentos de
cada um.
Fala-se pouco na pedagogia do amor, pois não se compreende
que ela representa muito do que se tem hoje por mais avançado em termos
de pedagogia: a) mais liberdade aos educandos de escolherem o que querem
estudar; b) menos imposição de ideias; c) desenvolvimento crítico; d)
educação pelo exemplo; e) estímulos à sensibilidade, à conectividade, à
empatia e à fraternidade; f) trabalho das mais diferentes habilidades
(ou talentos, ou inteligências), considerando que cada ser é único,
especial e suas inteligências se manifestam distintamente; etc.
“A educação, convenientemente entendida, constitui a chave
do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres,
como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á
corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte,
porém, exige muito tato, muita experiência e profunda observação”.
Como se dá pouco valor aos grandes pensadores da história, a
exemplo desses citados aqui e em outros textos, iremos analisar em
artigos futuros a contemporânea teoria das inteligências múltiplas, de
Howard Gardner (Universidade de Harvard), buscando comprovar que a
pedagogia do amor, preocupada com os diferentes tipos de inteligência,
mas especialmente com as esquecidas
inteligências moral e emocional, é um dos caminhos para um futuro com amplo desenvolvimento, sustentabilidade e elevada qualidade de vida para a humanidade.